quarta-feira, 9 de setembro de 2009

Bereu.




Quando se é criança, você muitas vezes não dá o devido valor às pessoas que te rodeiam. Não digo aos seus pais ou parentes próximos, mas para pessoas que geralmente temos pouco contato, aquelas que você sabe que existe, sabe onde mora, mas que não procura conhecer melhor.

Bereu torcia pelo Flamengo e eu, para o Fluminense. Sempre quando descia a minha rua rumo à escola, ouvia daquele senhor gordinho e careca com palito entre os dentes, uma pequena saudação:

_ Ô Flamengo!

Eu simplesmente olhava para cima, para uma área cheia de gaiolas de passarinho e respondia:

_ Ê Fluminense.

É claro que quando o Fluminense perdia, eu tentava me esconder. Mas, era em vão, e a saudação nessa hora era seguida apenas de um, não tem mais jeito com o seu time.

Mas milagres também aconteciam em Dom Silvério e quando o Flu vencia, eu tentava inovar. Lembro-me que cheguei a fazer um desenho para ele, copiando o escudo do Fluminense de um velho LP do meu pai. Acordei cedo aquele dia, mais cedo que o Bereu e por debaixo da porta da casa dele, joguei a cartinha, com o mesmo dizer de sempre:

_ Ê Fluminense.

Esse foi o nosso diálogo por anos. Todos os dias, o Bereu estava lá, em sua área, cuidando dos pássaros e me saudando da mesma forma. E eu, simplesmente, dava a minha resposta costumeira.

Assim, tão rápido como as nossas saudações, Bereu se foi. Não consegui ir ao seu velório. Fiquei sabendo dias depois, eu já não morava em Dom Silvério.

Pensei por um tempo, que deveria ter o conhecido mais. Pensando, eu descobri que naquelas poucas palavras repetidas que trocávamos diariamente, existia uma boa amizade. E com ele aprendi que, para fazer amigos de verdade não é necessário falar muito, o que importa de fato são as palavras certas.

E mesmo sabendo que não vou ouvir nenhuma resposta por agora, não posso deixar de dizer:

_ Ê Fluminense.